Contra todo o fascismo: a autodefesa da sociedade!
- Lêgerîn
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Por Cudî Raperîn

A mera raiva não levará a besta do fascismo à derrota; é necessária uma metodologia superior à crueldade do fascismo, caracterizada por equilíbrio, ética e inteligência. Exige-se astúcia. O cálculo frio do inimigo não adere a valores humanos, éticos ou morais; extrai unicamente força do fanatismo do poder e da brutalidade que daí resulta. Isto manifesta-se no caos inimaginável dos acontecimentos da Terceira Guerra Mundial que se estão a desdobrar ao olhar de todos/as.
Agora, importa a questão que Vladimir Ilyich U. Lenine se colocou: "Que fazer?".
Este “o que fazer” é também a pergunta sobre como nós, jovens, podemos apresentar uma frente unida contra o fascismo e derrotá-lo. Há 50 anos que existe uma resistência feroz nas terras do Crescente Fértil. A juventude do Curdistão, juntamente com a juventude internacionalista de todos os cantos do mundo, representa uma frente crucial de resistência internacionalista. O Estado ocupante turco é o clímax do fascismo do século XXI. Por trás do regime genocida turco estão a NATO e o Estado de Israel. Ideologicamente, o fascismo turco na sua campanha de aniquilação contra o Curdistão representa, assim, também uma campanha de aniquilação contra toda a humanidade. O fascismo do Estado turco é um produto da modernidade capitalista. O Estado turco agiu como Ministro dos Negócios Estrangeiros da NATO para o Médio Oriente, constantemente a tentar, por todos os meios sujos possíveis, assimilar o berço da humanidade no capitalismo global.
As Muitas Cores do Fascismo
Abdullah Öcalan analisou detalhadamente, nos seus textos de defesa, como o Estado turco lançou as bases para o sionismo e, portanto, para o atual Estado de Israel. O proto-Israel surgiu da incipiente República turca. Reduzir o fascismo apenas a Mussolini, Hitler ou Franco não seria apenas limitado, mas também iria ao encontro dos interesses do liberalismo. De igual modo, o fascismo não pode ser reduzido à "psicologia de massas"; o fasicsmo é um processo muito mais profundo, não observado apenas em movimentos de massas. Tais abordagens superficiais da sociologia e psicologia positivistas são um obstáculo ao desenvolvimento de um entendimento mais profundo. Porém, entender é o primeiro passo para uma luta bem-sucedida. Se não o analisarmos, não compreenderemos porque o "fascismo negro" alemão emergiu da liberal República de Weimar, porque o chamado "fascismo verde" do Islamismo foi reforçado pelos EUA e pela Turquia, e porque o "fascismo branco" foi reforçado pelo sionismo e vice-versa.

O que une todas as formas de fascismo – branco, negro e verde – é a sua origem. O fascismo não existe isoladamente, está estreitamente ligado ao fluxo da modernidade capitalista, baseada no Estado, no poder e na violência. Estes, por sua vez, assentam nos últimos 5000 anos da marcha triunfante do patriarcado e da escravidão das mulheres e da vida. O fascismo e o patriarcado estão assim intimamente relacionados. Ou seja, o fascismo precisa do patriarcado porque a cultura e a liberdade das mulheres e da vida protegeriam a sociedade das ideias fascistas. Assim, inicialmente, o fascismo cria inicialmente uma gaiola para as mulheres, afastando-as do seu papel social revolucionário.
Genocídio social
Massacres físicos e culturais são elementos centrais do fascismo. A homogeneização da sociedade apaga línguas, história e cultura. Milhares de línguas já foram exterminadas ou distorcidas até à irreconhecibilidade ao longo da história. Até as atuais línguas "oficiais" do sistema mundial, como o inglês ou alemão, ou línguas coloniais como o espanhol e francês, têm pouco a ver com as suas origens.
A língua é um espelho do pensamento e da história. Para cimentar o seu domínio na sociedade, o fascismo precisa de sistematicamente proibir e reprimir línguas carregadas de história e naturalidade, como o curdo, quíchua, tâmil, gaélico, inuktitut e milhares de outras línguas indígenas (ou assimilá-las até restar pouco delas). Uma das primeiras ações de Mussolini foi proibir todos os dialetos e línguas diferentes na Itália, criando assim uma língua italiana fictícia. O que, como regra, é também roubada dessas línguas assimiladas.

Uma história ainda por escrever
A história é reescrita ou esquecida, especialmente a das mulheres. Nem a história do patriarcado nem da resistência e vida das mulheres foi devidamente registada. Como disse o nazi alemão Göring: "O vencedor será sempre juiz e o perdedor acusado". A historiografia oficial ensinada nas escolas representa apenas a história da dominação e da miséria. Um grande obstáculo para o sistema é assim a cultura popular, incluindo a língua e história. A diversidade cultural é uma contradição direta do fascismo, razão pela qual ele tenta manipular a cultura e usá-la contra o povo. As roupas tradicionais, a gastronomia, as danças, as canções, histórias e mitos são destruídos ou proibidos, ou então postos ao serviço do Estado. Tal como Mustafa Kemal criou a República Turca sob o lema
"Uma língua, uma pátria, uma cultura, uma bandeira, uma nação"
Resgatar as nossas culturas contra o fascismo!
Língua, história e cultura formam a identidade de um povo e uma nação. A voz forte da sociedade é silenciada pelo fascismo até quase perder a capacidade de expressão. Um movimento jovem revolucionário deve responder com força através da diversidade. Na luta contra o fascismo, deve-se fortalecer a identidade coletiva ao defender e revitalizar língua, história e cultura. As mulheres, em especial as jovens que participam em movimentos juvenis antifascistas, devem afirmar claramente o seu protagonismo na luta contra o fascismo, sobretudo num contexto em que, no mundo ocidental, o papel da mulher tem sido cada vez mais instrumentalizado pelas forças fascistas.
O fascismo europeu em particular é especialmente traiçoeiro nesta abordagem. Coloca mulheres na linha da frente para poder afirmar: 'Vejam! A mulher está a emancipar-se, passou de dona de casa a estadista!'. As ideias por detrás disto não são nada menos que a base do próprio fascismo. Este está adormecido no Estado, apenas à espera de ser libertado em toda a sua crueldade. História, língua e cultura são sistematicamente manipuladas pelo fascismo, e os/as jovens em particular são enganados/as por esta ideologia.

Um movimento jovem revolucionário deve fortalecer a sua consciência histórica, familiarizar-se com a sua cultura e defender a sua língua. Desta forma, pode criar uma identidade altamente consciente e capaz de se defender contra qualquer ataque fascista. Contudo, no sistema atual da modernidade capitalista, não é possível defender a identidade sem organização. O sistema concentra-se cada vez mais em espalhar o liberalismo com métodos de guerra especial, enfraquecendo personalidades e, assim, tornando cada vez mais difícil a organização.
Necessidade de nova liderança jovem
Uma organização forte é formada por indivíduos fortes, e indivíduos fortes surgem numa organização forte. Uma organização, um movimento, é composto por todos os seus diferentes elementos que formam, em conjunto, um todo. Seria estranho se um corpo consistisse apenas de muitos órgãos idênticos, por exemplo, 78 pulmões em vez de pulmões, coração, rins e intestinos. Todos os órgãos funcionam à sua maneira, integrados no quadro geral – o corpo. Dentro dele, funcionam harmoniosamente como uma orquestra. Contudo, tanto um corpo como uma orquestra precisam de um maestro. Os movimentos juvenis revolucionários têm enfrentado uma crise de falta de liderança desde a primeira revolução juvenil de 1968. Em cada geração da história, houve personalidades fortes que assumiram a difícil tarefa de abrir caminho. O século XXI também precisa dos seus pioneiros. Com o complô internacional contra Abdullah Öcalan, em 15 de fevereiro de 1999, a NATO, Israel e a Turquia esperavam destruir de vez o movimento de libertação curdo, sequestrando o seu pioneiro prático-ideológico e mantendo-o isolado em İmralı. Mas uma verdadeira liderança não é simplesmente caracterizada pela presença física.
Zaratustra, Mani, Abraão, Jesus, Maomé, as irmas Trung do Vietname, Abraham, Mani, os Trung, Jesus, Maomé, as irmãs Trung do Vietname, Che Guevara, Ho Chi Minh, Thomas Sankara, Şehîd Sara Sakine Cansiz, Şehîd Kemal Pîr e milhares de revolucionários/as da história continuam a viver nas mentes de milhare de milhões de pessoas, mostrando-lhes o caminho. A juventude revolucionária e internacionalista desta época deve colocar-se honestamente na questão da sua liderança e agir em conformidade. A luta contra o fascismo está à procura dos seus pioneiros!
Assim, Abdullah Öcalan e a ideologia do Movimento Curdo pela Liberdade, a sua filosofia e o seu paradigma para uma vida livre representam um valor universal. Seja na análise do fascismo, na história do patriarcado, na análise do estado, do poder e da violência ou nas suas alternativas; na investigação da Jineolojî (ciência das mulheres e da vida), na modernidade democrática e na revolução das mulheres, Öcalan propôs uma solução que representa um caminho para todos os povos do mundo em luta.
Educação como ação contra o fascismo

Para compreender o fascismo e as suas soluções em profundidade, é necessário um entendimento ideológico mais profundo através da educação. Nada deve impedir-nos de colocar a educação no centro das nossas vidas, 24 horas por dia. A educação vai além da leitura. Cada momento pode transformar-se em educação; a educação é um modo de vida. Ser socialista traz consigo esta responsabilidade. Como o fascismo manipula a consciência histórica e a memória coletiva da sociedade, devemos defendê-las e aprofundá-las como uma tarefa de autodefesa. Em todos os momentos, mesmo que não haja ataques físicos, assassinatos ou massacres; métodos de guerra especial e manipulação continuam constantemente a tentar influenciar-nos ideologicamente. Tudo o que não se encaixa no paradigma fascista será alvo de destruição.
Isto é particularmente evidente na realidade da sociedade curda. O fascismo turco criou o conceito do "bom curdo" e do "mau curdo", onde o "bom curdo" é simplesmente o curdo assimilado, sem vontade própria e completamente integrado no sistema. O "mau curdo", ou o "terrorista", é o curdo que resiste e defende a sua cultura. Esta lógica pode ser encontrada em todo o lado no mundo atual. Esta mentalidade também pode ser aplicada ao patriarcado e à realidade das mulheres.
Especialmente durante a violenta Terceira Guerra Mundial, o pensamento em termos de preto e branco desempenha um papel importante na manutenção do estado de guerra. Meios como as redes sociais, notícias massificadas e a indústria do desporto criam a ilusão de reduzir as pessoas aos seus instintos básicos como comer, dormir, beber e sexo. Isto conduz a uma estagnação mental da qual o fascismo precisa para hipnotizar e adormecer a sociedade. Que a Terceira Guerra Mundial está em curso há trinta anos não é segredo; basta olhar para o estado do mundo para que isto fique imediatamente claro. É importante compreender que há uma rede muito mais complexa por trás da Terceira Guerra Mundial do que houve por trás da Primeira e Segunda Guerras Mundiais. A humanidade está numa guerra existencial, e o resultado desta Terceira Guerra determinará a continuação ou não da humanidade. Para tornar os/as jovens incapazes de lutar e indefesos perante os ataques, o sistema cria impotência, desesperança e niilismo.
O fascismo não é invencível

Mas a luta contra o fascismo não é uma luta contra um poder invencível. O fascismo baseia-se no poder, mas o fascismo pós-moderno é especialmente um sistema frágil. Não está profundamente enraizado na sociedade. Nenhum sistema baseado no Estado, no poder e na violência consegue enraizar-se profundamente na sociedade. Pelo contrário, esses sistemas são débeis. A Europa é um exemplo claro disso. O fascismo moderno – sob a aparência de Meloni, AfD, Prawo i Sprawiedliwośćer (PiS), Rassemblement National, Fratelli d'Italia – ganha força numa fase em que a sociedade está no ponto de ebulição. Todas as crises imagináveis com as quais a sociedade luta levaram-na à raiva, ao medo e à impotência. Os/as jovens na luta contra o fascismo, com uma boa compreensão histórica, uma linguagem clara e autêntica, domínio da arte da propaganda e um estilo de vida cultural alternativo, podem colocar o último prego no caixão deste fascismo de vidro e destruí-lo. A educação pode ajudar os/as jovens a compreenderem que o fascismo não é tão invencível quanto se diz.
Ao mesmo tempo, seria uma autêntica e devastadora ilusão e uma negação histórica pensar que a autodefesa física não é uma necessidade absoluta. Qualquer pessoa que aprenda com a história dos últimos milhares de anos perceberá isso: onde o inimigo não vê possibilidade de massacre cultural, realizará um massacre físico. Para além da educação, da organização da sociedade e da luta a nível da nossa própria mentalidade, a autodefesa física deve ser cuidadosamente pensada e organizada adequadamente. A guerra popular revolucionária tem fortes modelos na história e no presente. No espírito dos irmãos e irmãs Trung do Vietname há dois mil anos, passando por Lepa Radic até Şehîd Zîlan; a resistência contra o fascismo tem muitas frentes e, no espírito do internacionalismo, estas frentes irão unir-se numa só.
Hoje, as montanhas livres do Curdistão são a linha da frente do socialismo. A sua vitória fará recuar o fascismo pós-moderno significativamente no campo de batalha da humanidade. Cada ataque do fascismo às montanhas livres do Curdistão é, portanto, um ataque ao próprio socialismo. A construção da modernidade democrática é assim o remédio para a doença do capitalismo.
É tarefa de cada socialista defender os valores da humanidade, os valores do socialismo, e usá-los para desferir um golpe mortal contra o fascismo.
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